
Pois é!
Hoje vou dar uma aula de culinária!
Um dia, há muito, muito, muito tempo atrás, estava O Todo Poderoso Criador sentado à sombra duma bananeira, aborrecido que nem um cacho a ver a relva crescer, quando teve uma ideia genial: "Vou criar um ser novo, algo nunca antes visto, uma criatura moldada à minha imagem e semelhança, tão perfeita que crescerá e prosperará neste mundo, e que o tornará num lugar melhor!"

E criou o Adão! (Bom, não foi assim tão linear quanto isso... Teve de fazer um estudo prévio para ver qual a melhor solução para a estrutura do novo ser, depois teve de fazer uma série de testes para aferir qual o melhor material constituinte, depois mais isto e aquilo, também foi necessário ir apanhar barro, fazer uns quantos moldes, e ao fim de umas quantas tentativas lá saiu o Adão! Os abortinhos que resultaram das tentativas anteriores nem perguntem o que é que lhes aconteceu...)

E assim foi... Sacou duma ponta e mola e abriu um buraco no abdómen do Adão para lhe extrair cirurgicamente uma costela. Pôs um panelão grande ao lume, juntou barro, umas rosas, atirou para lá a costela e deixou a cozinhar... Umas horas mais tarde verteu o conteúdo para uma forma e aguardou até arrefecer.

De seios redondos e altivos, com formas formosas mas firmes, uma pele elástica e tisnada, como se acabada de chegar de umas férias de dois meses numa qualquer praia paradisíaca do Brasil, um cabelo de tom acastanhado e enormes caracóis pelo meio das costas, Eva era mesmo aquilo de que Adão estava a precisar...
A receita tinha saído perfeita! (pelo menos até ter comido a maçã e ter lixado tudo... Ah, e até ter posto as mãos ao volante de um carro... Pff, isso foi outra coisa que também não vinha prevista na receita original...)
Uns milhares de anos mais tarde, depois de muitas receitas, umas mais bem sucedidas que outras, "The One" voltou a tentar fazer um update da raça humana.
Olhou para o mapa e viu um espaço vazio... Dacia era o seu nome...
Pôs lá petróleo, ouro, gás natural, bons recursos agrícolas, umas paisagens bestiais e começou a confeccionar um novo ser para habitar tão rica e próspera terra.




Começou então a juntar tudo num panelão.
Colocou uma porção de barro, para dar consistência, uma mão cheia de pelos de cão, 3 dl de sangue do Isaltino Morais, mais 4 dl da Fátima Felgueiras, 5 dl do Avelino Ferreira Torres, 6 dl do Major Valentim Loureiro e umas raspas da borracha dos pneus do carro de fórmula 1 do Schumacher.
Mexeu e deixou ao lume a alourar.
De seguida, pegou no charme da Ana Malhoa, na classe da Lili Caneças, no estilo do Quim Barreiros, no intelecto do Toy e na inteligência do José Castelo Branco e condimentou o preparado.





Como reparou que tinha sido demasiado económico na dose e que não ia conseguir encher totalmente a forma, resolveu colmatar essa falha com dois ratos que iam a passar mais uma mão cheia de roupas velhas.
Só que havia ali qualquer coisa que não jogava muito certo... Do tacho emanava um aroma estranho.
Na tentativa de remediar, resolveu retirar aquela pontinha solta de ética que restava, todo o civismo, porque vendo bem não jogava certo com o resto dos condimentos e mexeu outra vez com força.
Bom, mas com tanto tempo ao lume, já havia bocados que estavam a ficar queimados e colados às paredes do tacho, então, sem grandes cerimónias, despejou tudo de uma só vez na forma e deixou-a a arrefecer.

Só então reparou que se tinha esquecido de alguns ingredientes, e que ao ter vertido tudo de uma só vez, o preparado não havia ficado bem misturado.
"Bom, seja o que Eu quiser..." pensou "The One" para si próprio enquanto aguardava com expectativa o resultado de mais uma receita.
E assim foi... Desenformou e... - "Óh meu Eu!!!" - exclamou espantado.
Pois é!
Chamou "Romeno Padrão" ao resultado desta receita.
Bom, assim muito por alto e de forma bastante crítica, esta é um pouco a ideia que eu tenho de uma porção muito significativa dos Romenos.
MAS ATENÇÃO: não se pode estender esta ideia a toda a população. Há aqui pessoas IMPECÁVEIS, super civilizadas, honestas, trabalhadoras, afáveis, atenciosas, educadíssimas, pessoas simpatiquíssimas, só que não reflectem o geral das pessoas com quem até agora tenho tido contacto.
Pode ser que esteja completamente errado, e que esteja a ser profundamente injusto, mas a minha percepção deste povo é a de um povo que se libertou há muito pouco tempo de um regime altamente opressor e particularmente castrador a nível emocional, e denota uma enorme ânsia de mostrar prosperidade e bem estar, algumas vezes exacerbada a níveis um tanto ou quanto absurdos, algo bem patente na quantidade de carros topo de gama que se vêm a circular por aqui por Bucareste.
Para a generalidade dos Romenos, a necessidade de ostentar um enorme carrão sobrepõe-se à necessidade de possuir uma boa casa... Há quem gaste tudo num topo de gama e depois viva num pardieiro miserável. Mas isso talvez também aconteça um pouco em Portugal, e simplesmente eu não repare por estar demasiado habituado, ao ponto de considerar uma tal banalidade que a tomo como um dado adquirido que passa "invisível" ao lado da minha percepção.
Mas por aqui tenho visto coisas inacreditáveis.
Civismo e simpatia devem ser considerados por muita gente como "bens" acessórios, não merecedores de qualquer esforço ou destaque.
Receita para confeccionar um "Romeno Padrão", Parte II: "Comentário objectivo pós-choque inicial"
Pois é!
Olhando para trás, para aquilo que escrevi em Fevereiro vejo agora o quão injusto estava a ser para este povo.
A receita original era antes para a excepção, para a ralé que confirma que na generalidade, apesar de por vezes serem um tanto ou quanto "naifs" e parolos, os romenos até são boa gente.
Agora que estou em Sibiu conheço uma realidade completamente diferente.
Um país seguro, não muito organizado, mas com vontade de crescer, um país ainda fortemente influenciado por uma classe política de moral duvidosa, onde apesar dos quase 20 anos de democracia que contam já após a queda do Ceausescu, continua a reinar a corrupção e o tráfico de influências.
Pelo menos aqui as pessoas são afáveis, calorosas e altamente religiosas! Há para aqui igrejas ortodoxas em tudo o que é sítio!
E há muita gente que cumpre todos os preceitos religiosos cá do sítio. Ficar 40 dias sem comer carne antes da Páscoa, ir à missa, ter uns santinhos no carro, sei lá!
Até nos cumprimentam dizendo "Christos a înviat", ao que temos de responder "adevarat enviat" ("Cristo foi enviado"; "Foi deveras enviado")!
Ahahahahahahaha! Só rir!
Então para um ateu como eu... Pfff, mas vá lá, se os faz feliz, a mim também não me prejudica!!!
E que o meu ordenadinho também continue a ser "înviat" todos os meses, porque esse sim, traz-me muito mais paz espiritual do que o primogénito do omnipresente!
Bom, a brincar a brincar esta miscelânea de ideias parvas já se estende um pouco mais do que o inicialmente previsto, a modos que por assim dizer, me parece que vou ficar por aqui!
Deixo só um grande abraço aos meus colegas romenos que estoicamente aguentaram os 40 dias da quaresma só a comer batatas com arroz, aos colegas romenos que não falam um boi de inglês, aos colegas romenos que mal conheço, à população romena em geral e à ciganada e remanescente cambada de indigentes em particular, ao Papa Bento XVI, à Madre Teresa de Calcutá, à minha família, à minha namorada, aos meus amigos, aos meus colegas de kickboxing, e a todos vós leitores críticos desta parvoeira literária que para bem de todos agora termina!
La revedere!